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Desafios da atual conjuntura brasileira para a luta das mulheres negras e populares será tema de encontro em Salvador

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Publicada em: 31 de maio de 2016
http://www.cese.org.br

Mulheres do Norte e Nordeste, ligadas a movimentos sociais do campo e da cidade, se reúnem em Salvador, entre quinta e sábado – 2 a 4 de junho, para discutir os rumos da política nacional e as recorrentes ameaças de retrocessos nas conquistas sociais dos últimos anos. Elas vão refletir sobre a atual conjuntura política do país, os reflexos do processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff na atuação de suas organizações, mas, principalmente, querem definir estratégias para o enfrentamento dessa conjuntura. O debate acontece no Grande Hotel da Barra.

Trata-se do Encontro Inter-regional Norte e Nordeste de Organizações de Mulheres Negras e dos Setores Populares, que tem apoio da União Europeia, da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), e do SOS CORPO – Instituto Feminista para a Democracia. As atividades são restritas às convidadas. Apenas no dia 03 (sexta-feira), às 18h, na Biblioteca Central dos Barris, o debate será aberto ao público sobre o tema central Desafios da Conjuntura à Luta das Mulheres Negras e dos Setores Populares por Direitos e Políticas no Brasil Hoje.

“Acreditando na força dos movimentos sociais e, particularmente na força das mulheres negras e dos setores populares para o enfrentamento ao conservadorismo político em curso na sociedade brasileira queremos, com esse encontro, favorecer um espaço às integrantes de organizações e movimentos de mulheres para elas debaterem e se situarem na atual conjuntura do país; além de promover voz e visibilidade à causa das mulheres negras e populares”, destaca a assessora de Projetos e Formação da CESE, Rosana Fernandes.

Rosana explica que o Encontro acontece no âmbito do projeto Mulheres Negras e Populares: Traçando Caminhos, Defendendo Direitos, iniciado em 2015 e com ações previstas até 2017. A iniciativa é voltada para o fortalecimento da luta e auto-organização de marisqueiras, quilombolas, indígenas, trabalhadoras rurais, seguidoras das tradições de matriz africana, entre outros grupos de mulheres. As ações incluem apoio a projetos mediante Editais e seminários, encontros e oficinas, envolvendo os nove estados do Nordeste, além do Pará, Amapá e Tocantins.

A iniciativa visa principalmente contribuir para a integração social e melhoria das condições de vida de mulheres negras e de mulheres de setores populares em situação de pobreza das regiões contempladas. Tem também o objetivo de fortalecer o protagonismo do segmento e de suas organizações no debate público e nos processos de participação social referidos às políticas governamentais de combate à pobreza, e de inclusão social de mulheres e da população negra.

Para Sílvia Camurça, do SOS Corpo, as mulheres alvo da ação integram o segmento mais atingido pelas ameaças aos direitos na atual conjuntura. “É sobre as mulheres negras e populares que vão recair todos os cortes das políticas sociais que estão sendo impostos pelo ajuste fiscal. Essa política que tem se mostrado problemática no mundo todo, será mais grave ainda no Brasil por conta da enorme desigualdade e do racismo que estruturam a nossa sociedade”, afirma. Camurca acredita que o encontro vai permitir às mulheres pensarem juntas e construírem estratégias para os seus movimentos adotarem na luta por resistência na defesa de seus direitos. “E esperamos que contribua para o fortalecimento desses sujeitos sociais”, conclui.

A CESE é uma entidade filantrópica que, há 43 anos, atua para fortalecer movimentos sociais e grupos populares que lutam por transformações políticas, econômicas e sociais, focando estruturas em que prevaleçam a democracia com justiça, intermediando recursos financeiros e compartindo espaços de diálogo e articulação. A instituição tem sede em Salvador, Bahia, e é composta por igrejas cristãs. Um dos meios para cumprir sua missão é o apoio a projetos de organizações populares.

O SOS Corpo é uma organização da sociedade civil, autônoma, sem fins lucrativos, fundada em 1981 e com sede em Recife, Pernambuco, que atua há 35 anos em prol da emancipação das mulheres, propondo a construção de uma sociedade democrática e igualitária com justiça socioambiental. Sua ação é fundamentada na ideia de que os movimentos de mulheres, como movimentos sociais organizados que lutam pela transformação social, são sujeitos políticos que provocam mudanças nas condições de vida das mulheres em geral. Para o instituto, a luta contra a pobreza, o racismo e a homofobia são dimensões fundamentais do feminismo, da transformação social para o enfrentamento do sistema capitalista, racista e patriarcal, produtor de desigualdades e sofrimento humano.

SERVIÇO
O Que – Encontro Inter-regional Norte e Nordeste de Organizações de Mulheres Negras e dos Setores Populares
Onde – Grande Hotel da Barra
Quando – 2 a 4 de junho de 2016

Debate aberto ao público
Tema – Desafios da Conjuntura à Luta das Mulheres Negras e dos Setores Populares por Direitos e Políticas no Brasil Hoje
Onde – Biblioteca Central dos Barris
Quando – 3 de junho de 2016

Comunidades embranquecidas: o desafio que se coloca…

mascarasbrancasPor Henrique Oliveira

O território de Irecê é demarcado por diversas tradições e manifestações culturais histórica e socialmente demarcadas. Manifestações como terno de reis; sambas de roda; capoeira e candomblé, mesmo que escondidas por uma cultura influenciada pelo embranquecimento cultural, são traços importantes da nossa identidade. Sabemos que tais traços são heranças da nossa mestiçagem original. São tradições advindas dos povos negros que, também na nossa região, se colocam como fundamentais para a nossa constituição enquanto sujeitos e grupamentos sociais.

As comunidades quilombolas (negras) no território de Irecê, porém, mesmo com toda essa influência sociocultural, sempre viveram às margens do reconhecimento por parte dos poderes públicos e. pasmem, por parte da própria comunidade remanescente de quilombos da nossa terra. Trata-se de uma negação, que representam muito da exclusão e violência material e simbólica que esses povos atravessam.

No Brasil, não é difícil perceber que as comunidades quilombolas enfrentam diversos obstáculos, das mais distintas ordens, para garantir seus direitos mais básicos. As dificuldades transitam desde o reconhecimento primeiro dos territórios, até a afirmação de ações positivas, que ajam no sentido de proteger e estimular a riqueza de manifestações culturais construídas no contexto de lutas e resistências de tais populações. Estamos falando de uma necessária ação de reafirmação das identidades político/culturais desses povos. Ou seja, da criação permanente de movimentos que fortalecer e estejam sempre aptos a reivindicar direitos.

Com a experiência do projeto Juventude quilombola percebemos que ainda temos um longo caminho a percorrer no sentido de garantir essas conquistas. Nosso projeto, a partir do patrocínio da PETROBRAS, ainda é uma ação pioneira. Uma ação que, para além da geração de renda e oportunidades para jovens quilombolas, se engajou ao longo de quase dois anos de trabalho, para o fortalecimento dos chamados  territórios materiais e simbólicos desse povo. Indentificamos, ao longo de uma jornada de atividades extensa, que ainda precisamos nos engajar naquilo que é mais genético para a resistência desses povos; ainda precisamos estabelecer um processo firme de territorialização (inclusive e, talvez, prioritariamente, simbólica) quilombola na nossa região.

Esse problema é muito sério. Uma vez que, de dezenas de comunidades que visitamos, apenas algumas poucas (setenta, para ser mais preciso) conseguiram o reconhecimento de comunidade remanescente de quilombos. No entanto, mesmo essas, sofrem com um intenso processo de invisibilidade. Não é raro que nos deparemos com jovens que neguem pertencer às suas comunidades ou que neguem a sua negritude. Num levantamento que fizemos em oito comunidade reconhecidas, grande parte dos jovens, com idade entre doze e vinte nove anos, se afirmaram como “pardos”. Tal fato levantou uma questão que se apresenta como um importante resultado do nosso projeto: Há, no território de Irecê, um enbranquecimento identitário das comunidades remanescentes de escravos?

Tal questão permanece. Porém, pela absoluta falta de discussões e políticas públicas acerca do  tema na região, percebemos que esses povos tendem a “perder sua cor” (e tudo que ela representa) frente às demandas de uma sociedade altamente violenta simbolicamente. Falamos de uma violência que, como afirmou Pierre Bourdieu, cria uma espécie de cumplicidade, mesmo que culturalmente “forçada”,  entre aqueles que sofrem e os que exercem a violência, “na medida em que uns e outros são inconsciente de a exercer ou a sofrer”. Estabelece-se assim, um ponto de  tensão sociocultural nas relações estabelecidas no nosso território.

O projeto Juventude Quilombola, assim como o Centro de Assessoria do Assuruá, trabalha no sentido de rediscutir e de promover ações que rompam com essa violência flagrante. Porém, essa é uma ação que, por se localizar muito no campo simbólico, muitas vezes passa despercebida pelo conjunto maior da sociedade. Diante disso, faz-se necessária a multiplicação de ações e projetos como o nosso. Mais do que isso, é mister que as comunidades quilombolas sejam alvo e agentes de políticas públicas consistentes: políticas que incidam numa recondução visível do lugar material e simbólico de tais povos…

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